segunda-feira, 12 de julho de 2010

JUVENTUDE USA ORKUT E YOUTUBE PARA CONFISSÃO DE CRIMES


Juventude confessa homicídios na internet
Gangues de Juiz de Fora estão utilizando o YouTube, a comunidade de vídeos on-line mais popular do mundo, para confessar assassinatos, fazer propaganda de facções criminosas, além de ameaçar integrantes de galeras rivais através de letras de funk e planejar invasões a bairros vizinhos. Dezenas de vídeos foram postados nos últimos anos por adolescentes de diversos bairros da cidade, e, em boa parte das imagens, disponíveis para qualquer internauta, os jovens aparecem em fotos com armas em punho e ainda fazem apologia às drogas e às facções criminosas do Rio de Janeiro: Comando Vermelho (CV), Amigos dos Amigos (ADA) e Terceiro Comando Puro (TCP). Os 23 vídeos pesquisados pela Tribuna causaram espanto até entre autoridades de segurança pública contatadas pelo jornal. Foram identificados armamentos de porte variado, como pistola 380, revólveres calibres 22, 32 e 38, carabina 38 e garrucha 22.
Em um vídeo publicado no ano passado, sob o título de “Jardim Natal ADA”, que já acumula mais de 52 mil visualizações, jovens confessam, na letra de um funk, o homicídio do servente Claudinei Fernandes, o Dinei, morto a pedradas em abril de 2007, no Jóquei Clube. “E pra quem não acreditava que o Natal ia pegar, tivemos que matar um pra eles acreditar (sic). Dinei tirava onda e gostava de apanhar. Até que chegou sua hora, e mandamos pra vala (sic).” Na época do crime, a PM apreendeu sete adolescentes, entre 15 e 17 anos, suspeitos de terem cometido o homicídio. Segundo a Vara da Infância e Juventude, todos os envolvidos já foram punidos. Em outro trecho do mesmo vídeo, os jovens confessam uma tentativa de assassinato ocorrida em uma lan house, também em 2007. A vítima é outro adolescente do Jóquei, alvo de cinco tiros, dos quais dois o acertaram no tórax e no abdômen. “Os moleques lá do Jóquei tentaram, não aguentou (sic). Invadimos a lan house, e tiro ele tomou (sic)”, segue o funk.
Outras postagens no You Tube revelam rixas entre bairros da Zona Sudeste. Em um dos vídeos, dois integrantes da gangue do Alto Grajaú simulam uma conversa, na qual planejam invadir o Nossa Senhora Aparecida. “E as armas, maluco, pode desentocar tudo?”, questiona um deles. “É. Tudo, tudo, moço. Desentoca fuzil, pistola, granada, tudo, mané. Pode levar até a ponto 30. (…) Só dá o fuzil para quem sabe mexer, tá ligado? Granada e pistola, tu desentoca aí e dá para os menor (sic).”
Em um link denominado diretrizes da comunidade, o YouTube garante que não permite “apologia ao ódio” e que recusa “conteúdos que incitam a violência ou encorajam atividades perigosas e ilegais que têm um risco inerente de causar danos físicos graves ou morte.”
Na visão do advogado Alexandre Atheniense, especialista em crimes cibernéticos, os adolescentes podem estar agindo de forma ingênua ao confessar tantos crimes violentos. “Avalio isso como total imaturidade. Essa pretensão de se tornar famoso através dos vídeos pode se tornar cara. A internet dá essa falsa sensação de anonimato e de que os crimes serão cometidos impunemente. Mas isso não é verdade.”
‘Morrer como homem é o prêmio da guerra’
Na Cidade Alta, integrantes do “Bonde dos Nike Fit” (ADA), do Jardim Casablanca, aparecem em outro vídeo com revólveres e escopetas em punho, ameaçando o grupo rival, do Dom Bosco. Já o “Bonde do Chelsea” (CV), formado pelos jovens do Dom Bosco, não faz ameaça clara ao grupo rival no YouTube, mas demonstra que os integrantes estão preparados inclusive para a morte. “O salário do pecado é a morte, e morrer como homem é o prêmio da guerra”, diz um trecho do funk que serve como trilha sonora, enquanto são mostradas imagens de jovens do bairro.
Já no vídeo postado por adolescentes do Eldorado, na Zona Nordeste, jovens sugerem que a gangue se encontra em um nível de aparelhamento semelhante ao de facções do crime organizado. “Temos tática de guerra e treinamento pesado. Sou chefe de artilharia do crime organizado.”, diz o funk inserido no vídeo “125 boladão”. O numeral 125 refere-se à linha de ônibus do bairro. Da mesma forma, gangues de outras regiões usam números de coletivos para identificar os grupos. O “Bonde do Chuck” (ADA), gangue de Benfica, é identificado pelo número 717. No Ipiranga, Zona Sul, jovens se unem para formar o “Bonde dos Adidas do Kaká” (ADA), representado pelo 132.
Apesar de referências ao tráfico de drogas nos vídeos postados, a juíza da Vara da Infância e da Juventude, Maria Cecília Gollner Stephan, acredita que a rixa entre gangues não tenha ligação direta com a venda de entorpecentes. “Eles querem fazer bonito com as meninas, e elas querem ser as primeiras-damas.” A visão da juíza não é corroborada por outras autoridades. “O principal motivo é sim o envolvimento com o tráfico. É imenso o número de representações contra menores; são centenas de casos que nos chegam”, afirma o promotor da Infância e Juventude, Antônio Aurélio Santos. O assessor de comunicação da 4ª Região da PM, major Sérgio Lara, concorda. “É temerário afirmar categoricamente, mas é bem provável que esses jovens estejam envolvidos com o tráfico.”
Falta atuação da polícia na internet
Ao contrário de cidades de grande porte, Juiz de Fora não tem grupos especializados em investigar crimes cometidos na internet. “Não temos equipe especializada, mas o setor de inteligência da PM acompanha essa situação, e os comandantes de cada companhia já fazem o mapeamento das gangues”, disse o assessor de comunicação da 4ª Região de Polícia Militar, major Sérgio Lara.
Assustada com as apologias escancaradas nos vídeos, a delegada adjunta da 1ª Delegacia Regional de Polícia Civil, Cristiane Maciel, informou que, se preciso, os delegados podem recorrer à Delegacia de Crimes da Informática, em Belo Horizonte. Ela prometeu ainda fazer o levantamento dos vídeos e orientar todos os delegados distritais a identificarem os jovens. “Isso assusta muito, pois eles estão usando armamento pesado. Acredito que não seja ingenuidade. Acho que é questão de desafiar o poder público.”
Para o advogado Alexandre Atheniense, o poder público tem condições de atuar na internet sem que seja necessário criar departamentos específicos. “Também não precisamos de lei própria para a internet, pois o Código Penal é suficiente. O Ministério Público tem possibilidade de pedir a quebra de dados cadastrais desses autores e solicitar que o provedor da internet informe o local de onde foram cometidos os crimes. ”
Alavanca de crimes
O promotor criminal Cleverson Raymundo Sbarzi Guedes acredita que a impunidade é a principal alavanca dos crimes cometidos por adolescentes. “A punição à infância e à juventude é muito branda”. Para a titular da Vara da Infância e da Juventude, juíza Maria Cecília Gollner Stephan, as medidas punitivas aos adolescentes infratores são suficientes. “Por incrível que pareça, o índice de reincidência não é alto.”
A juíza demonstrou estar ciente das publicações no YouTube, mas informou que não compete ao Judiciário tomar a iniciativa de coibir essa situação. “O titular da ação penal é o promotor.” Já o promotor da Vara da Infância e Juventude, Antônio Aurélio Santos, disse que as medidas cabíveis são tomadas, a partir do momento em que o Ministério Público recebe denúncias.
Símbolos de facções criminosas viraram marcas
Mais do que simples rivalidade interbairros, as gangues de Juiz de Fora assumem posições sectárias e incorporam as ideologias das facções criminosas do Rio. Quem se diz integrante do ADA tem como costume posar para fotos com os dedos em forma da letra “L”, em alusão a Paulo César da Silva dos Santos, o Linho, antigo líder da facção. No lado oposto, jovens que se denominam do Comando Vermelho aparecem em fotos reproduzindo as iniciais da facção.
Especialistas em violência urbana acreditam, no entanto, que a influência das facções criminosas cariocas nos jovens juizforanos tende a ser mais ideológica do que prática. “Aqui no Rio, muitos jovens não têm qualquer relação com venda de drogas e armas, mas, por morarem no morro dominado por uma organização, levantam a bandeira da facção”, analisa o jornalista carioca Vitor Abdala, especialista em políticas de Justiça Criminal e Segurança Pública, pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
Titular da Delegacia de Combate às Drogas do Rio de Janeiro, Alesandro Petralanda tem a mesma visão. “As facções acabam seduzindo os adolescentes, pois elas se tornaram símbolos de poder. E, na falta de heróis, eles acabam se apegando às siglas dessas facções.”
A questão da idolatria aos grupos criminosos foi reaquecida com a polêmica sobre o possível envolvimento do jogador Adriano com traficantes da Vila Cruzeiro, na Zona Norte do Rio. Uma foto mostra o atleta fazendo com as mãos as inicias do Comando Vermelho. “Infelizmente, as siglas dos narcoterroristas viraram logomarcas. Diante de um quadro de desemprego grande para os jovens, os traficantes oferecem a miragem do enriquecimento rápido e do consumo suntuário daí decorrente”, diz o professor Ricardo Vélez Rodrígues, coordenador do Centro de Pesquisas Estratégicas da UFJF. “Moro na pracinha de São Mateus e é comum, nas imediações, ver pichações com as logomarcas CV e ADA”, completa.
Estratégias de marketing
Apesar de não usarem todas as estratégias formais de marketing, as facções criminosas são exitosas na divulgação de suas marcas. Para o professor de marketing do Ibmec do Rio de Janeiro Augusto Uchoa, isso se dá, entre outros aspectos, pela presença histórica desses grupos nas comunidades mais carentes, pela constante demanda dos “produtos” oferecidos pelo tráfico, além do uso de diversos canais de comunicação, como as pichações nos muros. “As marcas como CV e ADA estimulam atributos e benefícios do produto, exploram componentes linguísticos, benefícios emocionais, geram valor de marca e acabam por entrar na mente dos consumidores, graças à comunicação de marketing e aceitação. Muitos jovens destas comunidades pensam: Se eu fizer parte deste contexto, terei aceitação, visibilidade, fama.”
FONTE: TRIBUNA DE MINAS

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